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A SÁBADO lançou o desafio a Sofia Reboleira: acompanhar uma expedição à gruta onde a bióloga tinha encontrado algumas das cinco espécies novas descobertas nos últimos anos.
“Tem a certeza?”, perguntou a espeleóloga em tom condescendente. “Então tragam galochas”, avisou perante a insistência.
A jornalista levou, o fotógrafo não. Má ideia.O fato-macaco que a espeleóloga usa para explorar as grutas prova o quão duro e sujo este trabalho é. E desistir começou a parecer uma óptima opção.
Ainda assim, a SÁBADO avançou por entre o arame farpado do terreno perto de Cantanhede até à entrada da gruta – cuja localização não pode ser revelada para que “as ideias não sejam divulgadas antes de serem publicadas”, diz Sofia Reboleira referindo-se aos biólogos concorrentes.
“Normalmente o dono disto não se importa, mas se um dia construir aqui uma casa, nunca mais nos deixa passar. Tenho de despachar a investigação aqui.”
Sofia Reboleira levava um fato polar vermelho por baixo de um fato-macaco impermeável com umas galochas incorporadas.
A SÁBADO estava num estilo mais casual: calças de ganga, ténis e luvas emprestadas. E os três de capacete – regra básica de segurança – e com lanternas na testa para ver o caminho.
À entrada da gruta a bióloga continuou: “Têm a certeza? Vão ficar sujos, molhados e há bichos por todo o lado. Houve um colega vosso da televisão que andou três metros lá para dentro e decidiu fazer a reportagem à porta.” Mas desta vez não há volta a dar.
Em menos de três metros voltaram as hesitações. Nas paredes, no chão e no tecto, naquele apertado corredor de rocha, havia aranhas gigantes penduradas por todo o lado.
“É bom sinal quando se vêem muitas aranhas. Elas vêm do exterior, por isso, se estivermos perdidos, significa que estamos a chegar à saída”, explica a bióloga. A equipa avança. “Têm a certeza? Elas mordem”, insiste Sofia Reboleira.
“Isto escorrega muito, por isso, ponham as mãos no chão”, diz a especialista ao chegar a um buraco estreito que dá acesso à primeira galeria.
“Falem baixinho para não acordámos os morcegos”, recomenda a guia. Sofia Reboleira garante que não se agarram aos cabelos mas depois acrescenta que voam contra as pessoas e que, se fossem incomodados, chegavam mesmo a morder. “Você também mordia, não mordia?”
Passado o buraco, chega-se a um beco sem saída. Afinal, o caminho era para cima.“Quem é que quer subir primeiro?” A expedição começa a parecer cada vez mais um jogo de computador: sempre que se ultrapassava um nível, surgia outro mais difícil. E agora era preciso escalar uma parede coberta de argila escorregadia. Parecia enorme mas afinal só tinha dois metros e meio de altura. Lá em cima, mais um túnel – onde só passa um corpo deitado.
“Sentem-se bem? Querem continuar? Isto é muito estreito, vejam lá se querem voltar para trás.” A brincadeira não perdia a piada para a investigadora da Universidade de Aveiro.
A gruta cheira mal por causa das fossas das casas que estão junto à superfície, segundo Sofia Reboleira que prefere nunca falar sobre os acidentes destas investigações.
Até porque “agora temos de voltar tudo para trás”, diz. O que significa dar umas quantas cabeçadas nos túneis, voltar a rastejar na lama, passar ao lado das aranhas, e chegar ao mundo com um frio terrível.
Sofia Reboleira sonhava enfiar-se nas grutas desde os seis anos, depois de visitar as turísticas da Serra de Mira de Aire. No liceu, nas Caldas da Rainha, juntou-se ao núcleo de espeleologia da escola e aprendeu as regras de segurança e as técnicas de progressão.
Depois foi estudar Biologia para Aveiro e percebeu que os dois mundos se podiam cruzar. Foi para Tenerife aprender como juntar as duas áreas que a apaixonam, porque em Portugal, isto dos biólogos estudarem debaixo da terra ainda é uma novidade.
Juntou-se ao instituto CESAM, de investigação do ambiente e estudos marinhos, fez o mestrado em Ecologia, Biodiversidade e Gestão de Ecossistemas e já está a fazer o doutoramento na Universidade de Aveiro.Em 2008 ganhou o Prémio de Mérito Cientifico-espeleológico, atribuído pela Federação Portuguesa de Espeleologia.
“Quando percebi que havia animais que viviam nas grutas, foi a cereja no topo do bolo”.
Por Joana Tadeu, imagem de Ricardo Pereira, montagem de Joana Mouta
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in SÁBADO
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