A ideia de que encontrar precocemente o cancro da próstata significa salvar a vida do diagnosticado, está errada. A mensagem tem sido difundida desde 1986, quando um teste de sangue que deteta as células cancerígenas deste carcinoma chegou ao mercado, mas um estudo de longo prazo provou que estes testes aplicados a homens entre os 55 e os 74 anos de idade, não impediram as mortes e encorajou tratamentos desnecessários.
O antígeno prostático específico ou PSA é uma enzima com algumas características de marcador tumoral ideal, sendo utilizado para diagnóstico, monitorização e controle da evolução do carcinoma da próstata. Esta sexta-feira, um estudo de longo prazo publicou os resultados de uma investigação que afirma que diagnosticar precocemente o cancro da próstata não salva a vida ao diagnosticado.
Os testes de rotina, aplicados a homens com idades entre os 55 e os 74 anos, não ipendem as mortes. “A mensagem é que a triagem de rotina em massa não é o caminho a percorrer”, disse um dos responsáveis pelo estudo, Gerald L. Andriole Jr. Do Hospital Barnes-Jewish, em St. Louis, nos Estados unidos da América (EUA). “Mas não é preciso eliminar completamente o PSA.”
O investigador explica ao Washington Post que a grande maioria dos cancros da próstata encontrados pelos testes PSA eram de crescimento lento e não letal. Mas nenhum teste pode classificar os cancros como potencialmente mortais ou não-fatais, forçando muitos homens a submeterem-se à terapia de radiação, cirurgias e medicamentos desnecessários. Esses tratamentos muitas vezes deixam os homens incontinentes e impotentes.
No entanto, este novo estudo não resolverá o debate sobre o valor do exame PSA, uma vez que os mais proeminentes defensores destes testes não mudaram de opinião e continuam a afirmar a eficácia e necessidade da sua utilização. William J. Catalona, um cirurgião da especialidade da Universidade de Northwestern, na Califórnia, diz que este estudo “tem muitas falhas” e acusa os investigadores de retirarem uma conclusão sem fundamentos científicos suficientes.
Estudo analisou 76 mil homens durante 13 anos
Lançado em 1993, o estudo financiado pelo National Cancer Institute e publicado no Journal of the National Cancer Institute, seguiu 76.000 homens em 10 cidades dos EUA, durante 13 anos. Metade recebeu testes de PSA anuais durante seis anos e exames retais digitais que podem ajudar a detectar alguns tumores da próstata. A outra metade continuou sob os cuidados regulares dos seus médicos de família.
Embora os médicos tenham descoberto cerca de mais 12 por cento de casos de cancro no grupo de rastreio com PSA, ambos os grupos têm igual número de mortes. Noutras palavras, o que o estudo revela, é que detetar mais cancros da próstata não reduz a taxa de mortalidade pela doença.
“Há uma tendência em acreditar que se um teste encontra a doença, é uma coisa boa”, disse Otis Brawley Webb, um especialista em diagnósticos de cancros e diretor médico da Sociedade Americana do Cancro. Mas, segundo o médico, pode não ser bem assim. “Estou muito preocupado com a ‘medicina de auditório’, onde uma longa fila de pessoas espera para obter análises sem haver discussão ou educação sobre os potenciais riscos e benefícios dos mesmos.”
O estudo foi lançado por médicos, investigadores e decisores de políticas que têm vindo a questionar se muitos dos testes, medicamentos e procedimentos médicos não serão usados em demasia, aumentando desnecessariamente os custos de saúde. O National Cancer Institute nunca recomendou exames de rotina, e a Sociedade Americana do Cancro aconselha os homens com mais de 50 anos a discutirem o teste com os seus médicos.
Tratamentos desnecessários e aumento dos custos de saúde
De facto, em outubro, esta questão surgiu num dos debates das preliminares para as presidenciais nos EUA. O painel de políticos ligados à saúde defendeu que os homens não deviam ser rotineiramente testados porque “a triagem não salva vidas e encoraja tratamentos desnecessários.”
Em entrevista à Reuters Health, Philip Prorok, co-autor do estudo e investigador do National Cancer Institute, em Bethesda, Maryland, afirmou que “se os homens estão a pensar fazer testes, devem estar cientes de que há uma possibilidade de que haja pouco ou nenhum benefício e certamente haverá danos no rastreio por PSA.” Esses danos incluem a captura e o tratamento de pequenas células cancerígenas que nunca teriam sido encontradas de outra maneira e, provavelmente, nunca teriam causado problemas a esses homens.
De acordo com o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças, cerca de 223 mil homens foram diagnosticados com cancro da próstata nos EUA em 2007, o ano mais recente com dados disponíveis, e 29.000 morreram por causa da doença. “Acho que, no futuro, é importante que médicos e pacientes falem sobre o valor e as desvantagens potenciais do teste”, disse Philipp Dahm, urologista e investigador do cancro da próstata da Universidade de Florida, à Reuters Health. “Tenho a certeza que fará bem a muitos pacientes, mas há um risco de potenciais danos. Os homens têm que saber no que se estão a meter.”
Virginia Moyer, médica, responsável pela equipa de investigação que realizou o estudo e professora de pediatria em Houston, diz ter “esperança de estarmos perto de um ponto de viragem. As pessoas começam a reconhecer que nem sempre uma detecção precoce é positiva. Só porque surge sob o título de ‘prevenção’ não significa que é bom sem serem analisados os dados que demonstram os seus benefícios primeiro”.
in RTP